Meebo Bar

domingo, 15 de maio de 2011

três minutos

Com um pé após o outro vou descendo a rua com naturalidade. Espero que só eu tenha reparado no quanto minhas mãos estão suando.
"Esse é um dia normal, como todos os outros. Normal. Normal . Normal." Só conseguia repetir incessantemente isto na minha cabeça. Dei um salto com a voz rouca de uma senhora do meu lado a desejar-me um bom dia. Ah, se ela soubesse o que está acontecendo! Talvez até saiba. Poderia ter passado por isso na minha idade, mas esta não é pergunta que se faça às pessoas, obviamente.
Quando finalmente cruzei a terceira casa amarela, percebi que já estava na minha rua. Minhas pernas começaram a tremer. Entrei, mais uma vez, com naturalidade. Ignorei as palavras que me foram lançadas da cozinha pela minha mãe. Subi as escadas e tranquei a porta do quarto. Estava no local do "crime". Soltei a sacola em cima da cama e escondi o rosto dentro das mãos. Tinha que ser feito, só não queria fazê-lo.
Nunca pensei que estas coisas poderiam acontecer justamente comigo. Sempre me considerei uma boa menina, tirando algumas notas baixas a matemática de vez em quando, mas isto é normal. Nunca causei problemas aos meus pais. Deixei esta parte do trabalho à minha irmã mais velha, que some nas sextas feiras noturnas e só retorna para casa na segunda de manhã. Mas voltando ao assunto...
Li as instruções umas cinco vezes para ter a certeza de que estava a fazer corretamente. Não parecia ser muito difícil, então fiz exatamente como estava escrito.
3 minutos.
Era só esperar três míseros minutos eu saberia se minha vida inteira estava acabada ou não. Não digo isso pelo drama, mas porque é verdade. Essa situação, como nenhuma outra igual na vida de uma mulher, são estes três minutos que fazem a diferença.
Comecei a chorar. Muito. Por três minutos tive um choro compulsivo.
Azul. Um azul tão celeste que pretendia transmitir paz, mas não conseguiria nem se fosse o céu inteiro dentro de uma fita.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

gaivota

O mundo era tão colorido... Eu ainda me lembro dos dias cor-de-rosa que andamos a passar. Sei que você também sentia isso. A maneira que olhava para mim já dizia tudo o que nem mesmo seus pensamentos tinham a coragem de revelar. Os beijos começaram envergonhados, errados, e arrisco dizer que até mesmo ruins. Mas passaram inevitavelmente a serem descarados, românticos e demorados. Mas sempre deve existir um mas. E o nosso mas era o verão. Você conheceu uma garota loira, de olhos verdes muito expressivos, mais do que todas as palavras de amor que eu te dediquei. Nada do que eu fizesse poderia vencer a cor viva de seus olhos não amadurecidos.
Quatro meses turbulentos. Na época parecia o fim. Foi a primeira vez na vida que eu tive um pingo de amostra do que é amar, e ser amada, e ser traída e ter o coração esmagado.
Mas não foi a primeira e última vez que passei por isso. Eu só tinha 15 anos, e o que me levou a "sobreviver" essa situação foi pensar que você era o único canalha no mundo. O que fez eu me enganar mais ainda, porque entraram alguns outros únicos no meu mundo.
Mas a vida dá voltas. Olha pra nós agora, relembrando do nosso verão de 28 anos atrás, aquele que nos conhecemos e vivemos um milésimo do amor que temos hoje. Aquele que nos reencontramos dez anos atrás e revivemos um bocado dos nossos tempos. Aquele que há cinco você me pediu em casamento. Aquele em que passamos a nossa lua-de-mel. Aquele que sempre nos amamos, e que eu continuo olhando pela janela com medo de você encontrar outra loira de olhos verdes, mais colorido que os nossos verões.

sábado, 5 de março de 2011

Rom e Juli

Descobri, no fundo de uma das gavetas, um pequeno caderno preto, com as páginas já amareladas de velho. Assim que o abri, minha alergia fez o favor de avisar que não devia fazê-lo, mas sou teimoso. Tinha uma caligrafia bonita, daquelas antigas em que os "l's" são esticados até lá em cima e os "g's" até lá embaixo. Eram poesias. Ou poemas, não sei a diferença. Mas não rimavam e nem tinham métrica. Ao fim de várias páginas descobri que se tratava de um romance. Um romance proibido. Interessante.
Era praticamente um Romeu e Julieta, só que da minha avó. Foi apaixonada a vida inteira por um rapaz que entregava jornais, mas seu pai, muito severo, nunca permitiu seu amor. Descrevia com emoção as fugas noturnas que faziam, e as táticas que utilizara para voltar pra casa. Minha avó, quem diria!
No meio do caderno havia uma foto dela junto dele quando era nova. Era tão bonita, tão meiga, tão... menina! Ele tinha um aspecto simples e frágil. Um casal diferente, com certeza.
Passei direto para o fim para tentar saber o que aconteceu. Mas não foi nada, o caderno acabou no meio, entre uma fuga e um retorno, e o que sobrou foi uma esperança, um passado, uma dúvida e um amor.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O dia

Se ao menos um entendesse...
Não tenho muito tempo, só 15 minutos para escrever esta carta. Sim, meu último desejo foi um estúpido papel e lápis. Nem sequer tenho tempo de me arrepender.
Tive uma idéia de última hora, que foi escrever isto. Agora que vou ter essa pena nem mesmo vale a pena mentir sobre a história toda, mas realmente não fui eu.
Não vou insistir na minha inocência. Não vale a pena.
Só queria dizer que gostaria de ter mudado. Tudo.
Me arrependo de não ter feito tudo aquilo que eu queria, de ter dado mais atenção a quem mais precisa, de ter amado ainda mais a quem amo...
Por que que ninguém quando está à beira da morte, diz que gostaria de ter trabalhado mais?
Porque todos se arrependem de ter dado muita atenção às coisas desnecessárias e ter fechado os olhos para o que o coração se abria.
6 minutos
Escrevi 13 linhas em 9 minutos. O tempo realmente corre, porque se passa tanta, mas tanta coisa na minha cabeça, e eu não tenho tempo de escrever para o mundo sobre nenhuma delas.
Aliás, o "não tenho tempo". Falei isso tantas vezes. Mal sabia do que dizia...
Agora sei, e mesmo assim não faço nada a respeito além de escrever um porcaria de uma carta para a minha família (mãe, eu te amo, antes de tudo) que não vai ter coragem de lê-la por um bom tempo.
Estão me chamando agora. Preciso ir. Preciso mesmo, mesmo ir.
Não sei sinceramente como me despedir, por isso vou acabar aqui, sem iniciar o assunto e sem acabar o nada.
Se ao menos um entendesse... eu não estaria aqui.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Quando a vida brinca

Quando o estômago dá voltas, quando as mãos suam, quando a respiração torna-se ofegante, quando tudo fica cor-de-rosa, quando o céu é mais azul, quando o cérebro trabalha mais rápido, quando o coração bate mais forte, quando você se arruma mais, quando você se importa mais, quando você não sabe o que dizer, quando você odeia o silêncio, quando você vê o sentido no que não tem e não sente o que deve, quando chora, quando sorri, quando anda, quando respira, quando os segredos entrelaçam, quando as falas acabam, quando os olhos se fecham, quando as mãos se abraçam, quando a noite caí, quando o dia sobe, quando a Lua acorda, quando o Sol deita, quando o vento sopra, quando já não se aguenta, quando vem o inverno, quando vem a primavera, quando vem o verão, quando volta o outono, quando a vida é triste mas assim parece feliz, quando a vida é feliz e sem você parece triste, quando se tem tudo e falta tudo, quando não tem nada mas tem meu tudo, quando...

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Rabiscos

Às vezes eu paro pra pensar como estou levando a minha vida. As pessoas normais estudam um pouco, trabalham, se apaixonam, casam, tem filhos, um boa parte delas se divorciam e casam-se novamente, outras simplesmente vivem tentando partir direto para o "... e viveram felizes para sempre". Mas eu acho que pra essas pessoas o sempre não vai ser nada de diferente do que está hoje.
Mas sinceramente, tenho medo. Medo de não ser feliz no futuro. Medo de ficar pulando de país em país e não encontrar um lugar pra mim no mundo. Medo de ter um sempre pior que o dessas pessoas.
E se eu estiver pedindo demais, sonhando demais, vivendo demais...?
Mas também tenho medo de estar vivendo muito pouco. Tenho medo de ter essas dúvidas todas e perder o meu sempre. Tenho medo de não conseguir o que quero e também não ter como voltar atrás depois. Tenho medo das minhas capacidades.
Tenho medo de viver com vivacidade.
O que vou fazer é continuar desenhando no meu caderno verde ouvindo música no comboio, levando um dia depois do outro e continuar dizendo que quero ser milionária. Tem dado certo até agora.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Lucky

Sim, eu vou escrever sobre o meu cachorro. Esse vai ser mais um alerta para as pessoas, para não abandonarem os cães na rua. Meu poodle se chama Lucky (nome bem tradicional para um cão, mas ele tem seus motivos não clichêrísticos), e tem de três a quatro anos. Concordamos em três e meio. É bem grande, pesa sete quilos, mas pensa que é cachorro pequeno e adora colo. Não consigo negar-lhe esse mimo e sempre deixo ele rasgar minhas meias-calças para ele ficar feliz em cima das minhas pernas. Nunca pensei que algum ser no mundo fosse me fazer acordar oito horas da manhã e me arrumar em 10 minutos para encarar o frio do inverno lá fora e ficar andando em círculos pelo gramado. Mas por causa dele eu faço isso, e por mais incrível que me pareça, não é por obrigação. O que faço por obrigação é brigar com ele quando nos esconde as meias dos pés, ou quando procura um osso no lixo. Mas sua cara de coitadinho é tão bem representada que me parte o coração de falar qualquer coisa.
Mas ele não é um cachorro normal, desses que a filha ganha de presente de Natal, ou que o namorado dá pra garota... Eu encontrei-o na rua. Ou melhor, ele me encontrou.
No dia 8 de Janeiro eu fui num jantar na casa da minha prima. Tentava não mostrar, mas estava extremamente triste. Minha mãe tinha voltado pro Brasil no dia anterior e eu realmente sentia a sua falta. Passei boa parte da noite do jantar ao telefone com outras amigas, por que sabia que se continuasse na presença dos meus primos iria chorar assim que falassem o nome da minha mãe.
Voltei pra casa com meu pai e, na entrada do prédio, havia um carro parado com cinco homens dentro. Estavam gritando e rindo. Descobri que riam de um cão que estava na chuva, tremendo de frio. Minha raiva e pena foi tanta que me abaixei e chamei pelo animal, mesmo sabendo que ele não viria. Os jovens do carro ficaram em silêncio, à espera de que nada acontecesse.
Meu pai já me tinha falado que ele estava perdido há um tempo, mas sempre achei que houvesse uma coleira em seu pescoço. Mas quando ele veio ter comigo quando o chamei, descobri que não havia nada.
Estava tão sujo, parecia até ser castanho ao invés de branco. A primeira coisa que fiz quando cheguei em casa foi dar-lhe de comer, mas ele não quis. Então dei-lhe um banho, e já se notava, embora pequena, a diferença.
No dia seguinte, à noite, descobrimos que ele definitivamente não nasceu um cachorro de rua. Em cima da cama do meu irmão tinha um pedaço de corda bem grossa, com aproximadamente 20 centímetros. Lucky vomitou-a. Não sei como não morreu sufocado, sinceramente.
De manhã o levamos ao veterinário e ao pet shop. Mas assim que entramos no carro, ele começou a chorar e debater-se completamente. A resposta: foi abandonado de carro, e tinha medo que fizéssemos novamente.
Segundo a veterinária, muitas pessoas viajam de Lisboa para a margem sul para abandonar os cães, por que logicamente é proibida a passagem de animais pela ponte 25 de Abril e assim os animais não têm hipótese de se lembrar onde ficam suas casas e voltar.
Esse é o ponto em que eu quero chegar. Lucky teve muita sorte por ter sobrevivido seja lá quantos dias ficou na rua, sendo marícas e manhoso da maneira que é. O facto de ter encontrado uma família infelizmente não é o mesmo fim que alguns dos outros cães também tem. E sim, estou muito feliz de ter o encontrado e por ele ter acabado com a tristeza que sentia pela minha mãe, mas se eu pudesse escolher gostaria que ele nunca tivesse passado pelo que passou na rua e estivesse feliz com seus verdadeiros donos. Acho que as pessoas não imaginam o quanto isso pode traumatizar os cães.
Nesse exato momento Lucky está deitado em cima do meu computador, enquanto eu tento alcançar o teclado com uma mão só. Um exemplo verdadeiro da sua manha e (se você conseguisse ver a cena) fofura. Espero que muitos outros tenham o mesmo fim que ele.