Era relatado da boca do pai de nossos pais as histórias que ele conhecia sobre a guerra, nas quais, por acaso, vovô ouviu-as pela primeira vez de seu próprio pai. Nosso bisavô foi um bravo militar, que morreu pelo chão que pisamos todos os dias. Já tive mais noção patriota, mas tanto quanto estes domingo nublados foram se tornando mera rotina, esse sentimento se foi perdendo. Entretanto ainda sonho com a imagem do meu antepassado sendo pulverizado com a mina escondida. Não era uma imagem rápida. Os poros se dilatando milimetricamente até os órgãos não serem mais comprimidos, mas sim expandidos. O sangue voando tentando encontrar o local que dantes pertencia, mas não podia ser impedido pela gravidade. Eu via ainda o coração querendo dar a última pulsação. Não deu tempo. E depois apareciam os outros soldados, correndo armados e cobertos pelo sangue e partes do meu bisavô. Eles nem olharam para trás. Um tiroteio. Ele gostaria de ter participado pelo menos desse último antes de explodir.
Mas nem tudo se baseava em sua morte. Os combates. Ah sim, os combates! Eram ainda mais assustadores que a mina escondida. Eram escritas cartas detalhadas a respeito disso, o que é raro. Li uma vez algumas duas. Passei três semanas sem dormir direito. Meu primo de 17 anos leu todas. Não fala sobre o assunto, e hoje em dia já não participa da roda, mas escuta da cozinha, com os olhos fechados, o vovô falando. Vai ter que se alistar ano que vem. Pretende engordar até lá para tentar não ser admitido.
Minha avó disse que essa infância fez meu avô amadurecer muito rápido, e é isso que ele quer de nós, os netos. Sendo essa a intenção ou não, molhei a cama muitas vezes.